Doce Poesia
Sebastião
Miriolli, um dia já fora chamado de Coronel, mas naquela época não passava de
um viciado em álcool e Jogo, a mulher Cecilia, apenas esperava a morte em sua
cama, entregue a uma doença já avançada, tuberculose.
A filha já tinha
seus vinte e sete anos, mas não pensava em se casar por não saber como deixar a
mãe naquele estado sem ao menos o auxílio do pai.
Beatriz,
doce e meiga Beatriz. Não imaginava que seu pai decidiria seu futuro nos
próximos momentos em uma mesa de jogo.
Era como um Saloon
de filme tipo Faroeste. O bar era movimentado apenas por fazendeiros falidos,
bêbados sem esposas e forasteiros.
Uma cidade
como aquela jamais guardaria um futuro digno de Beatriz.
-
Naquela
noite uma forte tempestade aproximava-se da cidade de Thoury, e Beatriz se desesperava com a piora da mãe.
As tosses
estavam mais fortes, Cecilia a certa hora tinha crises respiratórias. E isso
fazia com que Beatriz pedisse clemencia aos céus, o pai aquela hora ainda
estava fora de casa, não tinha como deixar a mãe sozinha para procurar ajuda.
-
Sebastião
jogava cartas com o ambicioso Bento, não era como o pai de Beatriz, era um
galã, e muito mais esperto e rico que Sebastião.
S: Eu quero
mais uma rodada!
Benn: Sem
ofensas meu caro, mas o senhor já está me devendo sua casa.
S:Mas agora
eu sei que irei ganhar.
O cheiro do
álcool chegava a incomodar Bento, que nem sentado tão próximo assim estava, mas
o cheiro estava forte.
Benn:E se
perder? O que vai me dar? Já não tens mais nada, velho.
S:Minha
filha, ela será inteiramente sua.
Benn: Sua
filha? – assustado-
Bom, podia
se ver de que não estava em seu juízo perfeito. Mas isso não interessava a
Bento, a única coisa que queria agora, era ganhar de mão beijada uma bela e
intocável jovem.
S: Sim,
minha filha. Ela é pura, nunca foi tocada por homem nenhum, é bonita também...
– interrompido-
Benn: Sei
bem quem é a sua filha.
S: E então?
– ansioso-
Benn: Então
vamos jogar! – sorrindo-
-
Enquanto
isso, na casa de Beatriz, a mesma estava com medo, a única pessoa em quem
confiava, a única pessoa pra quem poderia contar seus desejos e sonhos, estava
deixando-a.
C: Filha...
– sussurrando-
Beatriz
aproximou-se rapidamente da mãe.
B: Mãe, não
se esforce demais. Precisamos parar com essa tosse.
Os pingos de
chuva começaram, e Beatriz já não sabia mais o que fazer.
Então
aproximou-se da mãe para ouvir o que ela tinha a dizer.
C:Filha, eu
te amo. Fuja daqui, eu estou ... deixando esse mundo.
As palavras
cada vez mais incompreensíveis, Beatriz também sentia que a mãe estava indo.
C: Fuja, vai
ser feliz, meu...amor.
B:Mãe, eu...
mãe?
Cecilia
ainda tinha os olhos vidrados para ela, mas já sem vida.
B:Mãe...
–chorando-
Ela passou
as mãos pelo rosto da mãe, fechou seus olhos e entregou-se a toda a dor que
pudera aguentar.
-
Benn: Restam
apenas mais algumas cartas na mesa, meu velho.
S: Dane-se!!
Irei ganhar, eu sei disso.
Sebastião
jogou naquela mesa não apenas as últimas cartas em suas mãos, jogou ali... Os
próximos anos da vida de sua própria filha.
Benn: Não
dessa vez – jogando as últimas cartas na mesa e finalizando assim a sua vitória
no jogo.
O velho mal
podia acreditar, Bento o vencera da forma mais óbvia e simples que existia,
deixando o pai de Beatriz incrédulo.
S: Não!
Vamos jogas outra vez, eu posso ganhar a minha filha de volta. Vamos?! Eu sei
que posso.
Benn: Estou
cansado de jogos por hoje, quem sabe daqui uns anos.
Ao dizer
isso, Bento levantou-se de sua mesa e ajeitando o casado elegante, virou-se em
direção a porta para sair daquele lugar fétido e nunca mais voltar.
Com certeza
levara para casa o maior prêmio que poderia ganhar em um jogo de cartas com um
velho bêbado.
O Velho pai
de Beatriz sequer pensou em argumentar as coisas com a filha.
O que iria
dizer? De nada adiantaria, ela pertenceria ao fazendeiro e a ninguém mais.
-
Ele não
conseguiu chegar aquela noite em sua casa, bebeu ainda mais para esquecer o que
acabara de fazer, entre esmolas aqui e esmolas ali conseguiu mais alguns goles
de cachaça.
Beatriz
sempre cuidou das coisas da casa, as faxinas que fazia nas fazendas rendia-lhe
o suficiente para tratar da mãe e do pai.
Era uma
manhã feia, nublada, com um ar carregado, era como se o tempo acompanhasse o
luto de Beatriz.
Aproximava-se
das 11hrs da manhã quando Beatriz chegava em sua casa após o enterro da mãe.
Quando
entrou em sua casa, o pai estava caído ao sofá, onde nos últimos anos era a sua
cama.
As lágrimas
continuaram a cair, a dor era forte de mais, como se a qualquer momento Beatriz
saísse correndo para buscar a mãe novamente.
Irritou-se
com a situação em que o pai encontrava-se, era algo comum, algo que ele sempre
fazia, mas naquele dia não... Naquele dia ela não podia suportar tal atitude,
não queria suportar.
O impulso a
invadiu e com toda a dor que sentia, foi até o sofá e o puxou bruscamente do
sofá.
B: Como pode
ser tão insensível? Ela era a sua mulher, a mulher que você amou!!! Como pode?!
–gritando-
Sebastião
estava ainda um pouco atordoado. Mas conseguia entender a situação, só não
entendia o porquê a filha estava tão nervosa.
Nunca sequer
se importava com ele caído ao sofá. Pra ela nunca fizera diferença.
S: Me solta,
Beatriz!
A voz ainda
era um tanto arrastada e isso deixava Beatriz ainda mais furiosa.
B: Você não
esteve aqui quando eu mais precisei!!! Nunca esteve!! Eu te odeio! Você protagoniza
os piores momentos da minha vida, e eu nunca vou te perdoar!
S: Você não
fale assim comigo, filha. Eu sou seu pai, sua mãe vai saber disso e... –
interrompido-
B: Minha
mãe? Quer contar a minha mãe sobre isso?
S: A culpa é
dela, sempre te mimou demais.
Beatriz
apenas enxugou um pouco o rosto já molhado pelas lagrimas insistentes.
E
aproximando-se dele, disse calmamente:
B:Então vai
lá no cemitério dizer isso a ela. E que Deus te perdoe por tudo o que você fez
ela passar.
Ao dizer
isso, Beatriz virou-se e foi para seu quarto.
Alguns
minutos foram necessários para que o velho Sebastiao processasse o que acabara
de ouvir, sua mulher...
Em passos
apressados e embaralhados ele foi até o quarto onde a mulher ficava e a tanto
tempo ele não entrava.
A cama
estava vazia, o quarto cheirava a produto de limpeza e medicamentos, sem
dúvidas alguma fora o pior marido da história.
E mesmo
assim não mudou antes, Cecília morrera com as piores lembranças que ele pode
lhe oferecer.
Dobrou seus
joelhos sobre a cama, e deixou seu corpo desfalecer sobre ela.
As lagrimas
eram quentes, e tímidas. Sentia muito...
-
Naquele dia
Beatriz e Sebastião não se encontraram naquela casa.
No dia
seguinte esse encontro foi inevitável, o pai estava assustadoramente diferente.
O cheiro
leve de cachaça ainda pairava no ar da cozinha.
O Pai estava
sentado na mesa, e assim que ela entrou ele timidamente a chamou para sentar-se
ao lado.
Os olhos de
ambos estavam avermelhados e inchados, mas Beatriz sabia que o pai ainda não
estava totalmente sóbrio, e a última coisa que queria agora era conversar com o
pai bêbado.
B: Eu
prefiro não conversar com você sobre isso.
S: Não é
sobre sua mãe.
B: Logo
sairei dessa casa, a única coisa que me prendia aqui era a minha mãe e...
–interrompida-
S: Beatriz,
você irá se casar.
B: Como?